Uma cartilha inteiramente escrita para os educadores e com foco no dia a dia das instituições. Entender, discutir e reprimir a censura na escola exige organização. É isso o que o manual apresenta para os leitores.
Construído coletivamente, e assinado por mais de 60 entidades e organizações, o material oferece exemplos de casos reais e propõe soluções interligadas com diferentes áreas do governo e da sociedade.
Ou seja, o manual de defesa contra a censura está estruturado em torno de 11 casos envolvendo perseguições, intimidações e assédio a professores ou escolas. A partir deles são oferecidas estratégias político-pedagógicas e jurídicas para enfrentar ofensas. Usar o coletivo para defender o direito, segundo a cartilha, é a melhor opção.
O manual de defesa contra a censura
Ele foi desenvolvido e atualizado para direcionar você, professor ou profissional das instituições de ensino.
Entenda que, de acordo com o manual, é preciso criar um enfrentamento político-pedagógico dos problemas. Então, não se pode apenas ter como base as soluções judiciais individualizadas, já que elas abusam, em alguns casos, dos casos comuns. Sendo assim, essa pode não ser a realidade da sua região.
Quando a solução judicial é apresentada no manual de censura na escola, as estratégias jurídicas têm encaminhamentos um pouco diferentes. Afinal, a proposta é que as escolas defendam seus professores de tentativas de limitar a liberdade de ensinar em sala de aula ou mesmo fora dela.
De acordo com o manual, no caso da educação pública, o Estado deve começar a defender os professores. Menos medo e defesas individuais, mais comprometimento coletivo com a educação, com as escolas, com professores e professoras. Essas são algumas das premissas do livreto que traz muitas informações sobre censura nas escola.
A cartilha apresenta, de forma prática, 11 casos reais. Depois, dá algumas possíveis soluções para resolução deles. Confira como você também pode agir, já que não é permitido censura na escola, principalmente em instituições do ensino médio, onde costuma ser mais frequentes.
Confira a seguir os 11 casos expostos na planilha:
1) Nova legislação apresentada por vereadores ou deputados
Os deputados de uma Assembléia Legislativa Estadual derrubaram o veto do governador e promoveram uma lei que institui o chamado programa “Escola Livre” no âmbito do sistema estadual de ensino.
Este programa já é bem conhecido da sociedade e bastante difundido na mídia.
O objetivo é reforçar o que seriam os princípios de neutralidade política, ideológica e religiosa do Estado.
Além do reconhecimento da fragilidade do estudante como parte mais fraca na relação de aprendizado na sala de aula.
Tudo isso para dificultar, nas salas de aula, a prática de “doutrinação política e ideológica”, bem como quaisquer outras condutas por parte dos professores e da própria direção.
Estratégias político-pedagógicas
Para minimizar esses impactos que podem prejudicar a vida profissional e até pessoal dos trabalhadores, a participação dos sindicatos é fundamental. Além disso, é preciso reunir as organizações da sociedade civil e de movimentos sociais. Todos devem participar desse debate que é de extrema importância.
Além disso, uma boa dica é dar visibilidade ao caso. Os fóruns municipais e estaduais de educação, que reúnem representantes das redes de ensino, de sindicatos e de movimentos sociais da educação, devem participar.
Todos devem exigir que os gestores da rede de ensino se posicionem. Além disso, todos já citados aqui podem apoiar no sentido de exigir que as câmaras de vereadores e assembleias legislativas convoquem audiências públicas.
Para finalizar esse lado político, os prefeitos e governadores, diante de um embate político, podem mobilizar suas bases de apoio legislativas para o arquivamento de projetos em tramitação.
Estratégias Jurídicas
Além de todo esse movimento social para diminuir a censura na escola, o mais importante do ponto de vista jurídico é compreender e disseminar o assunto. Sempre unindo forças da escola e dos professores.
É preciso destacar nessa defesa que a simples supressão de termos como “gênero”, “orientação sexual”, “diversidade”, “racismo” não significa proibição de tratamento de tais temáticas nas instituições de ensino.
2) Interferência direta do poder legislativo na escola
Uma carta chegou até a diretoria de uma escola. Essa instituição é referência em inovação educacional na rede pública da região. O ofício veio de um vereador da cidade. Nele, o parlamentar questionou a realização de um evento sobre gênero na escola. Além dessa intimidação, ele exigiu a suspensão imediata da atividade que foi proposta.
Estratégias político-pedagógicas
Levando em consideração esse exemplo, a escola cobrou que a Secretaria de Educação do município se manifestasse. Sempre, é claro, em apoio à comunidade da escola.
Além disso, por ser fortemente apoiada pelos moradores da região, o assunto logo ganhou destaque na mídia. Diversas associações e entidades da sociedade civil se mobilizaram em apoio.
Estratégias jurídicas
Sempre tem uma saída. Vale destacar, nesse caso, que de acordo com os princípios e normas de organização em matéria de ensino, a proposta pedagógica é de competência da escola. Sempre com participação dos professores e da própria comunidade. Sendo assim, a defesa jurídica pode seguir essa linha de defesa e argumentação contra a censura na escola.
3) Interferência de prefeitos, governadores e secretários de educação
O caso se passa em uma cidade e tem como base uma provocação de membros do Legislativo. Por isso, o prefeito decidiu cancelar a distribuição de livros didáticos. De acordo com as alegações, os livros mostram famílias com formações diferentes. Ou seja, de acordo com a realidade social estudada nas obras e na sociedade.
Estratégias político-pedagógicas
Com base na proibição, a escola, organizações sindicais e a Secretaria de Educação da cidade precisam entrar em contato formal com o MEC e o Ministério Público Federal.
Afinal, a censura na escola está relacionada com a não distribuição e também o descarte de livros comprados com o dinheiro público.
Sendo assim, é importante que o caso ganhe visibilidade na mídia. Além, é claro, de mobilizar entidades sindicais e outros políticos contrários à censura e ao dano ao material didático.
Estratégias jurídicas
A defesa deve se basear no sentido de que nenhum órgão político tem poder sobre o que é ensinado em sala de aula. Tudo deve ter como base apenas a questão pedagógica.
Sendo assim, nenhuma esfera política pode trabalhar para impedir conteúdos pedagógicos. Além disso, é preciso revelar que se a ação seguir em frente, trará danos para o patrimônio público. Levando em consideração o descarte de material pedagógico pago com dinheiro da sociedade.
4) Interferência de membros da Justiça, da polícia ou de outros órgãos
Uma manifestação acontecia na escola. Sempre envolvendo a comunidade e também profissionais da educação. O ato incluía a distribuição de panfletos contra as ameaças de censura na escola da cidade.
O ato era também organizado por um “Comitê contra a Lei da Mordaça”. Com base nisso, a Polícia Militar decidiu intervir. Começou a intimidar o grupo, chegando a prender dois professores sob a alegação de “desobediência”.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- É sempre preciso acionar o sindicato
- Vale acionar os meios de comunicação e divulgar o caso
- Exigir um posicionamento da rede de ensino
- Desenvolver possibilidades na escola para debater o assunto
- Gestão democrática escolar
- Apontar quais pessoas na comunidade podem apoiar a causa
Estratégias jurídicas
A intimidação policial e a prisão dos professores em tal ato público são ilegais. Vale sempre ressaltar que a manifestação é livre no Brasil. Independentemente da classe que esteja participando e envolvida no processo.
5) Constrangimento de professores pela diretoria de ensino, supervisão ou direção da escola
Um professor decide falar sobre o atual momento político e econômico do país. Com base nisso, a diretoria chama a atenção do docente por causa de sua análise diante dos alunos.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- Vale conversar com a comunidade escolar e identificar os parceiros
- É preciso acionar os representantes da categoria de classe
- Informar o problema para fora da comunidade, na mídia.
Estratégias jurídicas
É previsto a liberdade de ensino em sala de aula. Os professores têm o direito de comentar assuntos sobre a realidade e atualidades. Sempre, é claro, deixando de lado o prejuízo da verdade e incluindo ideias diferentes.
6) Ameaça por pessoa externa à escola
Com base em uma atividade proposta em sala de aula sobre diversidade, um professor mandou um bilhete para os pais. O pedido era para que as crianças viessem para a escola, no dia da atividade, com roupas coloridas.
A proposta era compor o cenário de uma apresentação na escola sobre o tema diversidade. Com base nisso, uma mãe compartilhou a foto do bilhete em um grupo de WhatsApp.
Só que o conteúdo chegou a um pastor evangélico que também era vereador no município. Ele fez pedidos de esclarecimentos.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- Sempre encontrar pessoas da comunidade que apoiem a causa
- Conversar com a imprensa sobre o tema
Para a escola
- Contar com o apoio da rede pública de ensino, os gestores.
- Mapear conflitos e aprender com eles.
- Reforçar, depois do episódio, a participação da comunidade nas atividades da escola
Estratégias jurídicas
A Constituição Federal prevê a liberdade de ensinar. Além disso, com base nela, os entes das unidades escolares têm o direito à diversidade de ideias e pensamentos.
Já a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional são claras e defendem que a educação tem como base os critérios;
– liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber;
– pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;
– respeito à liberdade e apreço à tolerância;
– consideração com a diversidade étnico-racial”
7) Notificação extrajudicial para professor
O movimento da censura na escola está ganhando força e ficando cada vez mais estratégico. Com o objetivo de difundir o medo entre professores, eles até criaram um modelo de notificação extrajudicial.
O material é facilmente encontrado na internet e traz medo entre os professores. Em muitos casos, essa notificação tem sido usada pelos pais desinformados. A tentativa é sempre impactar e restringir o ensino na sala de aula.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- Saber quais entes da comunidade apoiam os movimentos
- Sempre consultar e chamar o sindicato da categoria
- Usar mídias sociais para dar visibilidade ao caso e informar
Para a escola
Difundir o conceito de que a família tem o dever de participar da comunidade escolar. No entanto, de que o conteúdo pedagógico é de responsabilidade dos profissionais da área.
Reforçar que a questão da vigilância é algo ruim e impede o trabalho dos professores. É preciso ampliar o debate de participação e não de intimidação. Quanto mais o assunto for discutido, mais ele perderá força.
Estratégias jurídicas
A principal recomendação do caso, portanto, é não se deixar intimidar pela notificação extrajudicial.
Vale ressaltar que esse documento não tem efeito jurídico que aparentemente se projetou para ele. Ou seja, não torna ilícita nenhuma conduta da docência. Sendo assim, vale lembrar que ninguém pode ser acusado de ilicitude pela prática de condutas que não são ilícitas.
Educar é permitido e não pode ser impedido por sociedades organizadas.
8) Divulgação de vídeo nas redes sociais
Um professor decidiu usar a criatividade dos alunos para debater um assunto pedagógico. Deixou então que os estudantes desenvolvessem uma paródia do funk Baile de Favela (MC João) baseada nas ideias do filósofo e sociólogo Karl Marx.
Durante uma apresentação dos alunos, o conteúdo foi filmado e postado nas redes sociais. A partir de então, o professor de Sociologia foi acusada de promover “doutrinação marxista”.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- Identificar os donos do comentários negativos e positivos
- Estreitar relacionamento com a comunidade
- Acionar o sindicato da classe trabalhadora
- Ativar a mídia
Para a escola
- Identificar se o caso é recorrente
- Construir relações de confiança entre famílias e professores
Estratégias jurídicas
A principal estratégia nesse caso é ganhar o apoio da mídia. Ela pode ser com relação à imprensa ou mesmo nas redes sociais. Além disso, vale ressaltar que é possível abrir processo nas áreas criminal e cível contra os agressores das redes sociais.
9) “Reclamação ou denúncia” divulgada na rede por estudantes, familiares ou colegas
Grupos que são contrários aos ensinamentos dos professores estão se organizando nas redes sociais. A proposta é desenvolver postagens pejorativas sobre os educadores. Eles querem disseminar “denúncias” contra profissionais da educação e instituições de ensino.
Tais grupos têm incentivado atos de perseguição e de intimidação a profissionais da educação. As postagens sempre estão relacionadas com uma possível “doutrinação político-ideológica” nas salas de aula. Eles divulgam informações pessoais, imagens, áudios e vídeos, ameaçando o bem-estar desses profissionais.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- Identificar pessoas e comentários nas redes
- Envolver o sindicato da área
- Acionar a polícia que trata de assuntos da web e formalizar um boletim de ocorrência
Para a escola
- Mapear conflitos e aprender com eles.
- Construir relações de confiança entre famílias e professores
Estratégias jurídicas
Divulgar a imagem pessoal de um profissional na internet, com o objetivo de intimidá-lo é crime. Sendo assim, o profissional pode tomar medidas judiciais contra os denunciantes.
10) Denúncia e abertura de sindicância administrativa
O deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSC) acionou o Ministério Público do Rio de Janeiro e a Secretaria Estadual de Educação. Ele quis pedir o afastamento de um professor que trabalha como diretor e professor de Sociologia. A justificativa era que o professor fazia apologia ao uso de drogas por ter uma tatuagem de folha de maconha no antebraço.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- Identificar e mobilizar aliados na comunidade escolar.
- Envolver o sindicato de sua categoria.
- Dar publicidade ao problema.
Para a escola
- Construir relações de confiança entre famílias e professores.
Estratégias jurídicas
A primeira proposta é tentar um acordo amigável. Conversar e pedir retratação pública. No entanto, se o caso for levado à diante, é preciso que o professor faça a sua defesa formal e por escrita no serviço público.
11) Denúncia formal ao sistema de Justiça
Foi construída uma exposição de arte por alunos do terceiro ano do ensino médio. Isso em uma escola estadual, em uma atividade de classe desenvolvida por professores da comunidade.
Alguns familiares sentiram-se ofendidos com um trabalho que abordava o tema do aborto. Nesse contexto, uma mãe de estudante da escola fez um boletim de ocorrência. O caso foi parar no Ministério Público do Estado gerando grande repercussão. A imprensa também debateu o tema.
Estratégias político-pedagógicas
Para o professor
- Identificar e mobilizar aliados na comunidade escolar.
- Envolver o sindicato de sua categoria.
- Dar publicidade ao problema.
Para a escola
- Mapear conflitos e aprender com eles.
- Construir relações de confiança entre famílias e professores
Estratégias jurídicas
Os encaminhamentos, neste caso são mais na ordem de defesa das acusações e imputações formas já colocadas pelos acusadores. O profissional deve procurar a imprensa e apresentar sua versão. Além disso, pode buscar uma conversa com os envolvidos. Caso precise, deve acionar a defensoria pública para se manifestar formalmente.
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